Na ocasião estiveram presentes o Presidente e vice do Anffa Sindical, Janus Pablo e Ricardo Aurélio, o Diretor de assuntos jurídicos Rogério Ferreira, a representante do escritório Torreão Brás, Ana Torreão, e demais convidados. O documento questiona a Lei por entender que ela maximiza os riscos à saúde pública justificando a declaração de inconstitucionalidade de diversos dispositivos contidos na norma.
A equipe jurídica, formada pelas diversas entidades que ratificam a propositura da Ação (relembre aqui), questiona cinco principais artigos da Lei 14.515, em especial o artigo 5º, que autoriza o Estado a habilitar pessoas físicas ou jurídicas para a realização de atividades relacionadas à defesa agropecuária.
Pontua que o desempenho das funções de certificação de regularidade de condutas é atribuição típica estatal realizada com exclusividade por servidores públicos ocupantes de cargos efetivos e detentores de poder de polícia administrativa, e que se realizada por particulares, contribui para a redução da proteção à saúde da população como um todo, em nítida afronta ao dever do Estado de assegurar a promoção à saúde (art. 6º e art. 196 da CF).
Nesse sentido, o grupo recordou ainda que a Suprema Corte já definiu em oportunidades anteriores que o exercício do poder de polícia por pessoa jurídica de direito privado não é incompatível com a Constituição Federal, desde que o agente integre a Administração Pública indireta e atue em regime não concorrencial. No presente caso, a habilitação para a certificação de conformidade foi delegada a pessoas físicas e jurídicas de direito privado, não integrantes da Administração Pública, e que atuam em regime concorrencial com finalidade lucrativa.
Arbitrariedades
Outro aspecto problemático da Lei é a inconstitucionalidade na forma como o texto foi trabalhado no Congresso Nacional. O texto, inicialmente aprovado pela Câmara dos Deputados, não previa a aplicação compulsória dos programas de autocontrole aos agentes da produção primária agropecuária. Entretanto, na sessão deliberativa de 20/12/2022 realizada no Plenário do Senado Federal, o Relator, do à época denominado Projeto de Lei 1.293, Senador Luiz Carlos Heinze, admitiu uma proposta de alteração no art. 8º, § 6, que não tratou de mero ajuste da redação sem modificação de sentido, mas de inclusão de nova categoria categoria de produtores (agricultura familiar) dentre aqueles cuja adoção dos procedimentos de autocontrole é facultativa.
Assim, diante do aumento da quantidade de agentes excepcionados da regra da Lei do autocontrole, a proposta deveria ter retornado à Câmara dos Deputados para nova votação, o que não aconteceu, tendo sido encaminhada no dia seguinte para a sanção do Chefe do Poder Executivo, ocorrida em 29 de dezembro de 2022.
Em sequência aos vícios formais destaca-se também a aprovação do art. 47 da Lei n. 14.515/2022, editada para dar nova redação ao art. 1º da Lei n. 13.996/2020, a fim de prorrogar duzentos e trinta e nove contratos por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público por mais seis anos.
Rogério Ferreira, do Anffa Sindical, chama a atenção para o fato de que não há impedimento à apresentação de emendas parlamentares aos projetos de lei de iniciativa do Executivo. Apesar disso, estas devem guardar pertinência com o objeto da proposta, o que não acontece neste caso, e mais, tal emenda acarreta consigo o aumento de despesas obrigatórias futuras, já que a permite prorrogação extraordinária de um gasto temporário, por período três vezes superior ao inicialmente previsto.
“A contratação de servidores ou empregados por tempo determinado é uma ferramenta que deve perdurar apenas até a satisfação da necessidade temporária, condicionada ao fim da situação de excepcional interesse público, ou à promoção de concursos públicos para provimento de cargos efetivos, outra pauta exaustivamente defendida por nós mas que não tem recebido os encaminhamentos necessários”, censurou o diretor.
Além de tantas inconsistências, Rogério também criticou a publicação da Portaria SDA/MAPA n. 736, de 29 de dezembro de 2022 que aprovou os procedimentos para adesão dos abatedouros frigoríficos ao sistema de inspeção post mortem com base em risco, aplicáveis aos frangos de corte, publicizada no mesmo dia da sanção presidencial à Lei n. 14.515/2022. Para ele, um ato infralegal regulamentar preparado anteriormente à própria sanção da Lei na certeza de sua implantação, a fim de viabilizar a imediata implementação do autocontrole pelo setor produtivo.
Providências
A Ação foi apresentada com pedido de medida cautelar, ou seja, com o objetivo de que se antecipem os efeitos propostos, antes do seu julgamento. Assim, a equipe jurídica do Anffa Sindical e entidades parceiras pedem a suspensão dos seguintes artigos da Lei 14.515/2022: (art. 3º, inc. V e VIII; art. 5º; art. 7º, inc. VII; art. 8º; art. 20 e art. 47
Adicionalmente requer que sejam solicitadas informações à Presidência da República, e sejam ouvidos, ainda, o Advogado-Geral da União e o Procurador-Geral da República, em consonância com os arts. 6º e 8º da Lei n. 9.868/1999; e
Por fim, pede que seja, ao final, confirmada a medida cautelar e julgado procedente o pedido para declarar, em definitivo, a inconstitucionalidade dos artigos citados em razão de suas incompatibilidades com os art. 6º, caput, art. 7º, inc. XXII; art. 37, inc. II e IV; art. 61, § 1º, inc. II, alíneas “a” e “c”; art. 65, parágrafo único; art. 174, caput; art. 196, caput; e art. 225, inc. V e VII, todos da Constituição Federal.
Janus Pablo destacou que a Ação tem o objetivo de assegurar a manutenção da fiscalização agropecuária direcionada à segurança dos alimentos produzidos e consumidos nacional e exportados a nível mundial. “Esperamos que as prerrogativas próprias de todas as carreiras da cadeira de defesa agropecuária, como a atividade de polícia por exemplo, sejam mantidas sob a tutela do Estado, evitando assim maiores danos à saúde pública.”